Arquivo de poesia

Palavras

Posted in Palavras with tags , on Setembro 21, 2008 by soniapessoa

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços…

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca… o eco dos teus passos…
O teu riso de fonte… os teus abraços…
Os teus beijos… a tua mão na minha…

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca…
Quando os olhos se me cerram de desejo…
E os meus braços se estendem para ti…

Florbela Espanca

Palavras

Posted in Palavras with tags , , on Agosto 12, 2008 by soniapessoa
Ha palavras que nos beijam como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas
Entre palavras sem côr,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.
(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

Alexandre O’Neill

poema retirado do cantinho Minha Força

Palavras…

Posted in Palavras with tags , on Julho 16, 2008 by soniapessoa

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: «Fui eu?»
Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa

imagem surrupiada ao amigo António

Palavras…

Posted in Palavras with tags , on Julho 13, 2008 by soniapessoa

” Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes, mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo. E que posso evitar que ela vá à falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
 
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um não. É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo…”
Fernando Pessoa

 *Algures na net...

 

Lembrar… Rui Knopfli

Posted in Dedicatórias with tags , , , , on Maio 1, 2008 by soniapessoa

 

“Um dia eu, que passei metade da vida voando como passageiro,

tomarei lugar na carlinga de um monomotor ligeiro,

e subirei alto, bem alto, até desaparecer para além da última nuvem.

Os jornais dirão: cansado da terra, o poeta fugiu para o céu.

E não voltarei de facto.

Serei lembrado instantes por família, meus amigos,

alguma mulher que amei verdadeiramente

e meus trinta leitores.

Então meu nome começará aparecendo nas selectas

e, para tédio de mestres e meninos,

far-se-ão edições escolares de meus livros.

Nessa altura estarei esquecido.”

                                                  Rui Knopfli

Rui Manuel Correia Knopfli nasceu em Inhambane, Moçambique, a 10 de Agosto de 1932 e fez os seus estudos na África do Sul. Poeta, jornalista, critico literário e de cinema, iniciou uma muito activa carreira na então cidade de Lourenço Marques, actual Maputo. Deixou Moçambique em 1975. É de nacionalidade portuguesa com alma assumidamente africana, terra que amou e trouxe no coração até ao último dos seus dias. Colaborou em vários jornais e revistas e publicou alguns livros. Desempenhou funções de adido cultural na Embaixada Portuguesa, em Londres. Faleceu em Lisboa em 1997. Eu, sua prima direita, em segundo grau, não tive a honra de conhecer o poeta, mas minha mãe deu-mo a conhecer e lembrou-o por muitos instantes da minha vida.

 

Rosas Vermelhas

Posted in Dedicatórias with tags , , , , , , , , , on Abril 24, 2008 by soniapessoa

Ontem, Dia Mundial do Livro, fui, a convite do Professor Ivo Machado, à Casa das Artes, em Vila Nova de Famalicão, assistir a um belíssimo momento de poesia, protagonizado pelo mesmo. Fiquei duplamente surpreeendida… por um lado, porque já há algum tempo que não assistia a um evento do género (muito tempo mesmo) e fez-me bem à alma, e, por outro lado, porque fiquei encantada com o dom da leitura e expressão do Professor Ivo Machado.

Ler não é só ler, só ler não basta. Ler lê-se a conta da água, da luz, e do telefone (como, aliás, referiu o locutor que se encontrava em directo para uma rádio, penso que local, perdoem-me este lapso). Para ler realmente é preciso sentir. É quase como engolir as palavras, levá-las, através da corrente sanguínea, ao coração e fazê-las soar de uma maneira que nos toca tão profundamente, como, ontem, me tocaram as palavras do professor.

E quando, embebida pelo ambiente, o professor Ivo leu, o que foi, o último poema da noite, “Rosas Vermelhas”, de Manuel Alegre, tive a certeza de que tinha, não só de escrever estas palavras de homenagem a tão sublime momento, como tinha de reproduzir aqui o referido poema.

Rosas Vermelhas

Nasci em Maio, o mês das rosas, diz-se. Talvez por isso eu fiz da rosa a minha flor, um símbolo, uma espécie de bandeira para mim mesmo.

E todos os anos, quando chegava o mês de Maio, ou mais exactamente, no dia 12 de Maio, às dez e um quarto da manhã (que foi a hora em que eu nasci), a minha mãe abria a porta do meu quarto, acordava-me com um beijo e colocava numa jarra um ramo de rosas vermelhas, sem palavras. Só as suas mãos, compondo as rosas, oficiavam nesse estranho silêncio cheio de ritos e ternura.

Nesse tempo o Sol nascia exactamente no meu quarto. Eu abria a janela. Em frente era o largo, a velha árvore do largo dos ciganos. Quando chegava o mês de Maio, eu abria a janela e ficava bêbado desse cheiro a fogueiras, carroças e ciganos. E respirava o ar de todas as viagens, da minha janela, capital do mundo, debruçado sobre o largo onde começavam todos os caminhos.

E tudo estava certo, nesse tempo, ou, pelo menos, nada tinha o sabor do irremediável. Nem mesmo a morte da minha tia. Por muito tempo ela ficou nos retratos e no jardim, bordando à sombra das magnólias, andando pela casa nos pequenos ruídos do dia-a-dia, até que, pouco a pouco, se foi confundindo com as muitas ausências que vinham sentar-se na cadeira, onde, dantes, minha tia se sentava.

E eu dormia poisado sobre a eternidade, como se tudo estivesse certo para sempre, eu dormia com muitos olhos, muitos gestos vigilantes sobre o meu sono. Por vezes tinha pesadelos, acordava, inquieto, a meio da noite, qualquer coisa parecia querer despedaçar-se e então exclamava:

– Mãe!

E logo essa voz, tão calma, entrava dentro de mim, mandava embora os fantasmas, e era de novo o meu quarto, a doce quentura da minha casa no cimo da ternura.

Não havia polícia nesse tempo. Ninguém roubaria a tranquilidade do meu sono, ninguém viria a meio da noite para me levar, porque bastava eu chamar:

– Mãe!

E logo uma voz, tão calma, mandava embora os fantasmas. E era a paz, nesse tempo, em que todos os anos, quando chegava o mês de Maio, ou mais exactamente, o dia 12 de Maio, às dez e um quarto da manhã, a minha mãe abria a porta do meu quarto e colocava, religiosamente, um ramo de rosas vermelhas sobre a minha vida, nesse tempo, em que dormir, acordar, nascer, crescer, viver, morrer, eram um rito no rito das estações.

Em Maio de 1963 eu estava na cadeia. Por vezes, a meio da noite, um grito abalava as traves da minha cabeça, direi mesmo da minha vida, e eu acordava suado, dolorido, como se um rato (talvez o medo?) me roesse o estômago. E era inútil chamar. Onde ficara essa voz que dantes vinha repor o sono no seu lugar, repondo a paz dentro de mim? E as manhãs penduradas no mês de Maio, onde acordar era uma festa? Onde ficara a ternura? Onde ficara a minha vida?

Em Maio de 1963 eu estava na cadeia. Dormia – como direi? – acordado sobre cada minuto. Tinha aprendido o irremediável. Alguma coisa, dentro de mim, se despedaçara para sempre (para sempre? Que quer dizer para sempre?). Era inútil chamar. Tinha aprendido, fisicamente, a solidão. Embora na cela do lado, alguém, batendo com os dedos na parede, me dissesse, como se fosse a voz longínqua do meu povo:

– Coragem!

Eu estava, pela primeira vez, fisicamente só, dentro do meu sono povoado por esse grito que estalava por vezes as traves da minha cabeça (onde essa voz que mandava embora os fantasmas?).

E era terrível essa manhã sem manhã, essa realidade branca e gelada, toda feita de paredes, grades, perguntas, gritos. Mesmo que na cela do lado, alguém, batendo com os dedos na parede, me dissesse:

– Bom dia!

era terrível acordar nessa estreita paisagem com sete passos de comprimento por sete de largura, tão hostil, tão dolorosa como as regiões dos pesadelos. Porque acordar era ter a certeza de que a realidade não desmentiria o pesadelo.

Mesmo que os meus dedos batendo na parede transmitissem notícias dum homem que podia responder:

– Bom dia!

de cabeça erguida era terrível acordar no mês de Maio, com a certeza de que no dia 12 a minha mãe não entraria pelo meu quarto, deixando-me na fronte um beijo, e rosas vermelhas sobre os meus vinte e sete anos.

Talvez seja preciso renunciar à felicidade para conquistar a felicidade. Eu estava na cadeia em Maio de 1963. Tinha aprendido a solidão. Tinha aprendido que se pode gritar com todas as nossas forças quando se acorda a meio da noite com um grito na cabeça e um rato (talvez o medo?), roendo-nos o estômago, que ninguém, ninguém virá repor a paz dentro de nós. E, então, é a altura de saber se as traves mestras dum homem resistirão. Pois só a tua voz, amigo, responderá ao teu apelo torturado na noite. E, nessa hora (a mais solitária das horas), se conseguires cerrar os dentes, dar um murro na parede, acender um cigarro, se conseguires vencer esse encontro com a solidão no mais fundo de ti próprio, com que alegria, com que estranha alegria, na manhã seguinte, tu responderás:

– Bom dia!,

mesmo que seja terrível acordar no mês de Maio, nessa estreita paisagem, gelada e branca, com sete passos de comprimento por sete de largura.

É certo que se podem escolher outros caminhos. Mas poderia eu ter escolhido outro caminho? Acaso poderia dormir descansado, onde quer que estivesse, sabendo que algures, na noite, há homens que batem, há homens que gritam?

Os fantasmas tinham entrado no meu sono, invadiram a minha casa no cimo da ternura; os fantasmas eram donos do País. E se eles viessem de repente, a meio da noite, e eu chamasse:

– Mãe!

A voz (tão calma) de minha mãe já nada poderia contra eles. Era um trabalho para mim, uma tarefa para todos aqueles que não podem suportar a sujeição. Eu nunca pude suportar a sujeição. Acaso poderia ter escolhido outro caminho?

Por isso, em Maio de 1963, eu estava na cadeia, isto é, de certo modo, eu estava no meu posto.
No dia 12 não acordei com o beijo de minha mãe.

Porém, nessa manhã (não posso dizer ao certo porque não tinha relógio, mas talvez – quem sabe? -, às dez e um quarto, que foi a hora em que eu nasci), o carcereiro abriu a porta e entregou-me, já aberta, uma carta de minha mãe. E ao desdobrar as folhas que vinham dentro do sobrescrito violado, a pétala vermelha, duma rosa vermelha, caiu, como uma lágrima de sangue, no chão da minha cela.

[Manuel Alegre]

Para além de tudo o que este texto tem de especial (amanhã comemora-se os 34 anos da Revolução dos Cravos), quando o professor elevava a voz e, quase, gritava “Mãe”… eu estremeci e pareceu-me ouvir o meu filho gritar por mim, em noites de pesadelos que se repetem tantas vezes. E também eu, lhe vigio o sono, e, com ternura, lhe mando embora os fantasmas. E esse foi um momento revelador, do que é ser/estar ou não livre. É bom saber que o meu filho, tem fortes probabilidades, de nunca descobrir a solidão e nunca festejar o seu 27º aniversário numa cela.

Obrigada Manuel Alegre, pelas palavras partilhadas.     

Obrigada Professor Ivo Machado, pelo momento que me proporcionou.

A partir de hoje, também eu, quero oferecer ao meu filho, não no dia 12, mas no dia 19, não às dez e um quarto, mas às vinte e trinta, também de Maio, rosas vermelhas, em sinal do meu amor.

Zeca Afonso (clicar em baixo)                 http://www.youtube.com/watch?v=y-UcmjEW11I

Frases de Sempre

Posted in Frases de Sempre with tags , , on Abril 11, 2008 by soniapessoa

“Todas as Cartas de Amor são Ridículas: as cartas de amor, se há amor, têm de ser rídiculas”

 continuo com Fernando Pessoa

Frases de Sempre

Posted in Frases de Sempre with tags , on Abril 10, 2008 by soniapessoa

A propósito de (mais) um conto que estou a escrever, lembrei-me da famosa frase, da poesia de Fernando Pessoa:

“Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal”

Gosto.

Escrever um poema

Posted in Uncategorized with tags , , on Abril 1, 2008 by soniapessoa

Para escrever um poema qualquer

A gente pensa, ensaia,

Faz rascunhos, remendos e emendas.

Escrever um poema qualquer é fácil,

Escreve-se quando se quer.

Mas para escrever um poema especial,

Aquele que mexe com o coração,

Que diz o que nos dói,

O que nos vai na alma,

O que amamos, ou achamos sublime.

Aquele que de lá sai inteirinho,

Sem costura, sem emenda, sem rascunho.

A gente não escreve quando quer.

Não se escreve.

Sente-se, respira-se, transpira-se.

E expele-se como que por artes mágicas

através de uma caneta qualquer.