Hoje vou de férias, são apenas cinco dias, mas fora daqui, o que é muito bom. Tinha já programado vir escrever um post a contar o quanto estou aterrorizada por ter de ir de avião para Londres, a nado não me pareceu uma alternativa muito boa, para dizer que vos levo no pensamento, para perguntar o que querem que vos traga de recordação, se algum de vós faz questão que transmita algum recado a Sua Alteza Real, a Rainha de Inglaterra, saber também se algum de vós partilha do mesmo fetiche que eu e que se resume a fazer cócegas nos guarda reais da dita rainha… mas tudo caiu por terra quando fui tomar café depois de jantar, peguei no jornal Público, e li uma reportagem sobre um dos jovens que foi julgado pelo brutal assassinio da transexual brasileira, Gisberta, de 45 anos, e que a 22 de Fevereiro 2006 foi atirada ainda com vida a um poço de 15 metros situado num prédio inacabado da Avenida Fernão de Magalhães, no Porto. Tinha sida em fase terminal e tuberculose, mas morreu afogada.
Deixem-me lembrar-vos que trabalhei durante 12 anos no coração da redacção do Jornal Público, no Porto, vivi de perto muitos dramas que fizeram ao longo desses anos as páginas dos jornais… vivi o drama do massacre de Dili, a queda da ponte de Entre-os-Rios, acontecimentos que me marcaram e que nunca vou esquecer. Ao ler a reportagem de hoje no Público, senti-me chocada, horrorizada até… recordei a notícia da altura, mas o relato dos factos feito na pessoa deste jovem, hoje com 18 anos, horrorizou-me. Dos 14 jovens envolvidos, 13 eram menores entregues a instituições que tinham por dever acolhê-los e dar-lhes um sentido à vida.
O jovem de que falo tinha sido retirado à mãe, bem como os seus três irmãos, porque ela não reunia condições capazes de ter consigo os filhos. Na reportagem não li nada sobre maus tratos, apenas falta de um lar digno (que afinal ela tanto deveria desejar), os miudos faltavam constantemente à escola… problemas sociais que o Estado deveria ajudar a resolver sem que fosse necessário retirar filhos a uma mãe. Os jovens foram então entregues a instituições, ou seja, entregues ao abandono… foi um desses filhos, um desses jovens, que, entregue a uma instituição, na companhia de outros em situação igual, agrediu, ao longo de vários dias até à morte, um ser humano. Esses jovens fizeram-no completamente desligados de qualquer tipo de sentimento, de qualquer tipo de remorso, de qualquer tipo de atitude que revelasse terem sentimentos capazes de os impedir de um acto tão cruel.
A descrição feita chocou-me, tanto como me choca saber que tantas crianças, tantos jovens são entregues ao abandono todos os dias por um Estado obrigado a protegê-los, pelo mesmo Estado que impede a adopção de crianças por casais homosexuais tão, ou mais, capazes de educar e acarinhar uma criança, dar-lhe um rumo que não seja o das ruas da miséria, numa cidade que se chamou Porto mas poderia ter um outro nome qualquer!…
Vou, mas volto… (até quarta-feira)