Obrigada Mafalda
O post que agora escrevo é talvez o que mais me vai custar escrever, dos que escrevi até hoje… porque fala de coisas que me tocam, que me são sensíveis de forma particular. O post que escrevo tem por objectivo principal enaltecer o livro que ontem li… Mafaldisses, da Mafalda Ribeiro.
“Morre lentamente… quem não encontra graça em si mesmo… quem destrói o seu amor próprio, quem não se deixa ajudar… Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da sua má sorte ou da chuva incessante…”
“Obrigada por me dares a sensibilidade de sentir o frio e o calor, de tocar e ser tocada… Obrigada por todas as vezes que olhei para o espelho e não gostei do que vi… Obrigada por levantares a minha cabeça para o céu para me fazeres reparar na beleza de uma lua cheia. E pelas frustrações e impotência que se transformaram em vontade de ir mais além.”.
“Amigo não é só aquele que empurra a cadeira ou baixa-se ao nível dela para conversar olhos nos olhos. No meu caso, amigo é também quem me tira de cima dela e faz dos pés dele os meus. Porque a deficiência não é nenhuma doença contagiosa, mas o amor é…”.
“Não fomos talhados só para observar mas para olhar alguém com profundidade. É ver muito para além do que pode ser visto, se calhar é darmos o salto para dentro de alguém e deixarmo-nos estar… É não cedermos à ilusão de um primeiro olhar, é deixarmo-nos ficar…”.
Estes excertos, retirados do livro Mafaldisses, são só um exemplo pequenino da imensidão de saber que nos é transmitida nas 52 crónicas que compõem este livro, este ensaio de vida, de saber viver. Obrigada Mafalda, por me teres permitido crescer um bocadinho mais e, na verdade, aceitar-me também a mim, como sou, um bocadinho mais… Quando hoje terminei de ler o teu livro, vieram-me as lágrimas aos olhos, porque me revi em tantas palavras que escreveste, muito embora tu sejas bem mais forte que eu e te ames a ti mesma muito mais do que eu me amo a mim… há 39 anos atrás nasci com uma pequena imperfeição no lábio superior (o lábio leporino é uma abertura na região do lábio, ocasionada pelo não fechamento dessas estruturas, que ocorre entre a quarta e a décima semana de gestação), os meus pais choraram e até aos três meses de idade não me são conhecidas fotografias… nessa altura fui operada pelo Dr. Gentil Martins e o resultado não foi o pior, tendo em conta que foi uma cirurgia que ocorreu à 39 anos atrás, onde as técnicas usadas não são as mesmas de hoje. Cresci habituada a que os meninos na escola me apontassem o dedo, a que fizessem perguntas, a não ser escolhida pela professora para fazer de Nossa Senhora nas festas de Natal, e habituei-me a um mundo onde não estar dentro dos parâmetros delineados para a chamada beleza nos impede muitas vezes de voar, principalmente quando nós próprios interiorizamos a nossa diferença de forma negativa (aqui comoveu-me, Mafalda, a grandeza da tua mãe quando te disse “Então as sandálias, fazem bom andar?”). Muito embora tenha sido, alguns anos mais tarde, submetida a uma cirurgia de correcção, os preconceitos da diferença (a minha é na verdade uma diferença mínima, quase imperceptível, comparada com tantas outras) ficam dentro de nós e só uma pessoa grande como tu os consegue ultrapassar… depois de te ler, acho que me encontro num bom caminho…
A vós amigos blogueiros, aconselho a leitura deste livro… faz-nos crescer, torna-nos maiores se sentirmos que aprendemos alguma coisa com ele… mostra-nos as diferenças como eu tento mostrá-las nos livros que escrevo para as vossas crianças… como mais valias no mundo da diversidade.
Outubro 23, 2008 às 5:29 pm
Mais um livro para adicionar a lista de compras quando for a Portugal. Tenho uma profunda admiracao por todas as pessoas que sendo portadoras de uma deficiencia ou doenca nao baixam os bracos. Sao verdadeiras licoes de vida que por vezes nos fazem sentir pequenos e mesquinhos.
Beijinho.
Outubro 23, 2008 às 6:58 pm
Obrigada pela sugestão, que já registei na minha lista. Tenho um pequeno vislumbre do que poderá ser viver com o estigma da diferença, a que sou muito sensível, de modo que não vou deixar passar a oportunidade de ler o livro. Depois deixarei aqui a minha opinião.
Outubro 24, 2008 às 5:54 am
Quem te leia… não parece nada que to custou a escrever!
Para além do livro, mostrou, isso sim, a tua sensibilidade, que é coisa que hoje em dia já poucos têm!
Outubro 24, 2008 às 8:40 am
Escrevi-o em lágrimas… obrigada e beijinhos
Maio 19, 2010 às 12:36 pm
Vai ser o próximo livro para eu comprar, tenho a certeza. Sou mãe de duas meninas gémeas com 7 anos de idade. A Joana também nasceu com lábio leporino e fenda palatina.
Onze minutos após ter nascido a Mariana, nasceu a Joana puseram-na em cima de mim e abracei-a, foi um momento muito particular!
Mais uma vez indescritível. Ser mãe duas vezes no mesmo dia, não é para todas. Foi mesmo muito especial.
Nunca tinha conhecido ninguém com lábio leporino, mas não me fez qualquer impressão. Talvez por ser minha filha, ou por estar mentalizada, pois já sabia que a Joana ía nascer assim.
Uma vizinha minha que conhecia uma menina que tinha sido operada pelo Dr. Gentil Martins, aconselhou-me a ir a uma consulta e ouvir a opinião dele. Não hesitei e marquei uma primeira consulta.
A Joana foi operada, e entretanto já fez 3 cirurgias. As cirurgias ficaram muito bem-feitas e agora quase nem se nota. A única coisa que falta, é corrigir o nariz, mas ainda não é possível, só na adolescência.
Estou muito grata ao Dr. Gentil Martins e se eu pudesse dava-lhe alguns anos da minha vida, pelo bem que tem feito a muitas crianças que, infelizmente, precisam dele.
Mas ……. Por vezes dou comigo a pensar no que será o futuro da Joana. Pensava que o pior já tinha passado mas agora penso que o “pior” ainda está para vir.
Como será o dia dela na escola? Na idade dela as crianças são muito cruéis umas com as outras. Noto que as outras crianças reparam que ela é diferente.
Olham, apontam, mas eu tento superar com toda a minha força, com aquela força que só as mães têm, que eu nem sei de onde vem! Apesar de doer muito! Por vezes sinto medo, evito pensar!
Admiro-a muito como ela é, e tenho muito orgulho nela.
Beijinhos para todas as crianças e mães, que no fundo são tão especiais.
Maio 20, 2010 às 10:22 pm
Olá Sandra, obrigada pelo comentário. Quero dizer-lhe que também eu, hoje com 40 anos, nasci com o lábio leporino. Nem sempre é fácil conviver com as diferenças, mas o caminho é para a frente e o lema é não desistir. Beijinhos, Sónia
Maio 22, 2010 às 11:11 am
Olá, Sónia obrigada pela força. Eu sei!!! E é isso mesmo que eu faço todos os dias, não desistir. Porque tenho a noção que tenho de ficar indiferente às pessoas que não sabem lidar com a diferença! Por vezes essas pessoas são adultas e não conseguem passar a mensagem aos próprios filhos para que estes possam aceitar e ajudar estas crianças. dizer-lhes que é precisorecebelas de braços abertos e apertá-las com muita força, tal como elas merecem!!!
Beijinhos, Sandra